Aleitamento de vitelos: algumas considerações | Informações Técnicas


O tema do leite que damos às nossas vitelas para além de amplamente debatido está longe de ser consensual. As empresas comerciais afirmam que o leite de substituição é a melhor opção nutricional para as primeiras idades, cada uma afirmando que o seu produto oferece mais vantagens que o produto da concorrência e muitos produtores questionam-se se a melhor opção não será mesmo o leite materno, pois este será, “em teoria” o mais adaptado às necessidades nutricionais da cria.

Historicamente o leite de substituição foi desenvolvido, tal como acontece com os humanos, para alimentar crias cuja mãe não tinha leite ou o leite que tinha não dispunha da qualidade requerida pela sua cria.

Vemos frequentemente mães a darem “leite em pó” aos seus filhos, por recomendação médica, quando o leite que têm é insuficiente em quantidade ou apresenta baixa qualidade nutricional.

Com os animais o contexto é similar. O leite de substituição era opção face ao leite de vaca, contaminado ou não com antibiótico, ou, quando o leite de vaca estava a ser bem pago pela indústria e portanto compensava entregar o leite produzido e comprar “leite em pó”.

Com o passar dos anos a indústria dos leites de substituição foi-se desenvolvendo e adaptando os leites cada vez mais às reais necessidades dos vitelos, utilizando matrizes nutricionais mais completas e utilizando fórmulas baseadas na composição do leite de vaca de há muitos anos atrás.

Sabe-se hoje que uma vaca de alta produção produz um perfil de leite adaptado para a indústria de consumo humano, porém, poderá não satisfazer as reais necessidades da sua cria, conforme ocorria no passado.  

Embora todos saibamos que o grande objectivo de um produtor consiste em ter bons animais em produção, dando especial atenção à alimentação, maneio, saúde animal, fertilidade, genética, etc. Sabemos também que os primeiros dias de vida são essenciais para definir a longevidade e a capacidade produtiva desse animal. Sabemos também que uma nutrição pré-desmame de excelência, terá resultados muito expressivos na lucratividade da futura vaca leiteira. por vários motivos, por exemplo, a menor frequência de doenças, um maior crescimento pré-desmame, um maior desenvolvimento do úbere e como consequência uma maior produção de leite.

Quais são afinal os factores chave para uma boa recria?

Os vitelos quando nascem, não têm imunidade. Então há que transferi-la imediatamente via colostro. Para tal recomenda-se um protocolo, conforme figura, com 4 passos. Ou seja, mais de 60g de Ig/L, administrado idealmente menos de uma hora após o nascimento à temperatura de 40ºC e na quantidade de 4 litros.

Durante os 3 a 4 dias seguintes deve ainda ser dado o leite materno ao vitelo.

 

E depois, o que fazer?

Sabe-se que um programa de alimentação em natureza de uma vitela é muito exigente, quer em tempo, quer nas necessidades da mãe. Por isso, e porque necessitamos do leite para a indústria de alimentação humana opta-se por um maneio alimentar mais intensivo.

A título ilustrativo mostra-se no quadro seguinte um programa de alimentação em natureza, tal como ocorria no passado e o que é praticado nos dias de hoje.

Percebe-se que pela redução do tempo de recria da vitela e consequentemente da idade ao primeiro parto, todos os processos terão de ser acelerados.

É perceptível que um vitelo em natureza era alimentado cerca de 6 a 8 vezes ao dia, enquanto que um vitelo confinado é alimentado entre 1 e 3 vezes ao dia. Para além de que o tempo de amamantação é mais curto, actualmente cerca de 3 minutos e o método de desmame também é substancialmente menor, passando de 16 a 24 semanas em natureza para 6 a 8 semanas confinado. Conseguimos perceber assim as elevadas exigências nutricionais de uma recria moderna.

 

O desenvolvimento dos órgãos internos é essencial

Os principais órgãos do vitelo (coração, fígado, pulmão, músculo) desenvolvem-se nos primeiros 50 dias de vida. Estes dias são determinantes para o futuro do animal. Um animal bem nutrido nesta fase não verá comprometido o seu crescimento e produções futuras. Um animal cuja nutrição seja pouco exigente nesta fase irá sempre apresentar alguma debilidade.

O leite é o “motor”

No quadro ao lado é visível que até aos 14 dias de vida 100% da energia absorvida pelo vitelo provém do abomaso, ou seja do leite. Ao dia 46, 60% da energia absorvida ainda provém do leite. Só após o dia 63 é que menos de metade da energia absorvida provém do abomaso.

Por isso se afirma a importância do leite na quantidade necessária e com a melhor composição nutricional possível.

 

E afinal que leite devo dar aos meus vitelos?

Dissemos no início que era um tema cuja resposta não é directa e por isso multifactorial. Porém sabemos e dizemos aos produtores que por convicção ou excedente de produção entendem dar leite materno aos vitelos que atentem muito aos factores críticos do leite, ou seja: não dar leite “de descarte” pois este apresenta níveis elevados de contaminação, pasteurizar sempre o leite e administrá-lo morno.

Quem pretende trabalhar com segurança, uma fórmula constante, isto é, produto sempre com a mesma qualidade e de composição nutricional reconhecida e comprovada deve optar por um leite de substituição de elevada qualidade.

 

Algumas considerações importantes

A ingestão de starter é muitas vezes reduzida nos primeiros dias de vida do vitelo, principalmente quando este tem um leite de substituição de elevada qualidade. É habitual e até bom, que consuma pouco starter durante os primeiros dias, até porque, conforme vimos atrás a energia que o animal metaboliza provém do abomaso e por isso do leite. Assim, ao dia 63 o vitelo estará a ingerir a mesma quantidade de starter que outros, independentemente da quantidade de leite que tomam durante o aleitamento (aproximadamente 2 kg/dia).

O maneio da água é da máxima importância!

Os vitelos devem beber água desde que nascem!

Devemos disponibilizar-lhes sempre água fresca e abundante.

Até cerca dos 50 dias, um vitelo bebe por dia entre 0,5 a 2 litros de água. Quando começa a fazer uma ingestão maior de starter o seu consumo de água aumenta muito, sendo em média 4 litros de água por cada quilo de starter consumido.

 

Miguel Rodrigues

Eng. Zootécnico Ruminex