Nutrição da cultura do milho forrageiro e interpretação de análises de solos | Informações Técnicas


No presente artigo pretende-se, embora de uma forma simples, sensibilizar os agricultores relativamente à fertilização da cultura do milho, abordando temas como a avaliação da fertilidade do solo, a descrição dos nutrientes importante para a cultura do milho, reação do solo (acidez ou alcalinidade do solo), a interpretação da análise de solo e  como calcular as quantidades de adubo necessário a aplicar.

Avaliação da fertilidade do solo

Os terrenos diferem na sua capacidade de fornecer nutrientes às plantas. Um solo fértil é aquele que é capaz de fornecer às plantas os nutrientes em quantidades e proporções adequadas ao seu crescimento e desenvolvimento e que, por outro lado, não tem substâncias tóxicas.

Do ponto de vista agrícola, o solo é a camada de terra sobre a qual as plantas se desenvolvem e que pode ter uma espessura considerável. No entanto, em termos práticos, só se considera a camada em que se desenvolvem as raízes. É, para a planta, não apenas um meio de suporte, mas também o principal sistema de armazenamento de nutrientes minerais e água. É formado por vários materiais que lhe conferem propriedades próprias, segundo a maior ou menor quantidade em que se encontram presentes.

A avaliação daquelas propriedades pode ser feita no próprio local, como a sua profundidade, a pedregosidade, o declive, etc., havendo outras, como, por exemplo, a maior ou menor riqueza em matéria orgânica e em nutrientes minerais, que só através da análise laboratorial o poderão ser.

O solo é constituído por matéria mineral, matéria orgânica, água e ar. Ao lavrar ou gradar o solo, o agricultor está a proporcionar às raízes da planta um meio mais adequado ao seu desenvolvimento, uma vez que as raízes necessitam de respirar. O teor de água varia constantemente, seja pela entrada de água, da chuva ou da rega, seja pela sua saída, através da evaporação do solo e da absorção pelas plantas. O ar e a água variam em sentido inverso, quanta mais água o solo tiver, menos ar existe.

A matéria orgânica é formada, principalmente, por restos de plantas, parcial ou completamente decompostos. Do ponto de vista técnico dá-se o nome de húmus à matéria orgânica totalmente decomposta e que atingiu um elevado grau de estabilidade. Acumula-se principalmente na camada superficial do solo, tornando mais fáceis de trabalhar os solos pesados, contém e armazena muitos nutrientes, como o azoto, enxofre e micronutrientes. Ajuda o solo a reter maiores quantidades de água, facilita a absorção de nutrientes pelas plantas, dá vida ao solo. Felizmente, os solos agrícolas da Região são ricos em matéria orgânica.

A matéria mineral é constituída por partículas de várias dimensões. Se no solo predominarem partículas com dimensão semelhante à areia da praia, diz-se que o solo tem textura arenosa, grosseira ou ligeira; se, pelo contrário, as partículas mais finas (como o barro) predominarem, o solo tem textura argilosa, fina ou pesada. Quando o solo se apresenta mais equilibrado, está-se perante um textura franca ou média.

Os nutrientes minerais estão ligados à matéria mineral e à matéria orgânica ou delas fazem parte integrante; podem, igualmente, estar dissolvidos na água que humedece a terra, em condições de serem facilmente absorvidos pelas raízes das plantas. No caso da cultura do milho, os nutrientes que mais afectam a cultura e com os quais o agricultor açoreano se tem que preocupar mais, são os macronutrientes azoto (representado por N), fósforo (P), potássio (K), magnésio (Mg) e o micronutriente zinco (Zn).

 

Que acontece aos nutrientes quando estão no solo?

Os nutrientes que estão no solo, sejam provenientes da matéria orgânica, seja da matéria mineral ou de fertilizantes aplicados ao solo, podem seguir vários caminhos: serem absorvidos pela planta; serem retidos pela argila (barro) ou pelo húmus, num fenómeno a que os técnicos chamam adsorção; ou podem ser arrastados pela água da chuva ou da rega, fenómeno a que se chama lavagem ou lixiviação.

 

Azoto (N)

O azoto é o nutriente nobre que mais vezes falta no solo e que é requerido pelas plantas em maior quantidade. Cerca de 98% do azoto do solo está ligado à matéria orgânica, constituindo o chamado azoto orgânico. O chamado azoto mineral, como o que é fornecido pelos adubos (e em parte pelos estrumes e chorumes), pode-se encontrar em três formas distintas:

Azoto amídico (de que é exemplo o azoto da ureia)

Azoto amoniacal (representado por NH4)

Azoto nítrico (representado por NO3, ou nitrato)

Todo o azoto do solo, seja orgânico, amídico ou amoniacal, é transformado no solo, acabando por ficar na forma de nitrato, que é a forma química que as plantas facilmente absorvem. Enquanto se encontra na forma amoniacal é adsorvido no solo, isto é, não se perde com facilidade por lavagem. Quando está na forma de nitrato é facilmente arrastado pela água, perdendo-se para as plantas, indo contaminar as águas superficiais e profundas.

O azoto dá cor verde às plantas, sendo muito móvel, isto é, em caso de carência a planta retira o azoto das folhas mais velhas e transporta-o para as mais novas e sementes. Por esta razão os sintomas de carência surgem primeiro nas folhas mais velhas que se tornam amarelas e acabam por secar, estendendo-se os sintomas progressivamente às mais novas. No milho, a mancha amarela tende a progredir da ponta da folha para a base, ao longo da nervura principal.

Uma unidade fertilizante de azoto corresponde a um kg de N. Por exemplo, a ureia tem 44% de N, o que equivale a dizer que em 100 kg de ureia há 44 kg de N; no nitrato de amónio a 27% há 27 kg de N em 100 kg de adubo, sendo metade na forma de nitrato (NO3) e metade na forma amoniacal (NH4); os adubos compostos com azoto (são os adubos que têm mais do que um nutriente nobre, neste caso além do azoto podem ter fósforo ou potássio), têm geralmente uma parte na forma de azoto nítrico e outra em azoto amoniacal). Dado o comportamento do azoto no solo, nomeadamente a sua capacidade de transformação em nitrato, o azoto pode ser aplicado às culturas em fundo (antes da sementeira, com azoto amídico e amoniacal e uma quantidade sempre pequena na forma de nitrato) ou em cobertura (depois da germinação das plantas, com azoto nítrico ou amídico e também amoniacal, embora em menor quantidade).

 

Fósforo (P)

A adsorção ou retenção do fósforo por parte do solo, através da argila e do húmus é muito forte, o que significa que se não perde por lavagem. A principal forma de perda de fósforo do solo é através da erosão. Estando adsorvido, pode não ser assimilável pelas plantas, perdendo-se através de vários fenómenos de retenção, que dependem de vários factores, sendo um dos mais importantes o grau de acidez ou de alcalinidade do solo.

Tal como no caso do azoto, o fósforo também é muito móvel no interior das plantas. Os sintomas de carência surgem também nas folhas mais velhas que acabam também por secar. Têm tendência a apresentar cor castanho-escuro quando secas e mais ou menos violácea antes de secar.

Uma unidade fertilizante de fósforo corresponde a um kg de P2O5. Por exemplo, no superfosfato de cálcio simples, a 18%, existem 18 kg de P2O5 em 100 kg de adubo e não 18 kg de P.

Dado o comportamento do fósforo no solo, as adubações com fósforo devem ser realizadas sempre em fundo, devendo o adubo ficar incorporado na terra. Se for aplicado à superfície não é, praticamente, aproveitado pela planta.

 

Potássio (K)

O potássio entra na composição de muitos minerais que formam o solo. É por esta razão que a maioria dos solos da região são ricos neste elemento. O seu comportamento no solo tem certas semelhanças com o do azoto amoniacal, isto é, não se perde com facilidade por lavagem. Como não se transforma noutras formas, as suas perdas são sempre pequenas.

Na planta, o potássio também é móvel. É raro aparecerem sintomas nas plantas jovens, aparecendo já na fase de formação da espiga. O sintoma mais típico é o aparecimento de uma faixa amarelada ou acastanhada nos bordos das folhas mais velhas.

Uma unidade fertilizante de potássio corresponde a um kg de K2O. No cloreto de potássio existem, geralmente, 60 kg de K2O.

 

Magnésio (Mg)

O magnésio e o cálcio (Ca) têm um comportamento no solo semelhante ao do potássio. Um solo equilibrado deve ter sempre bastante cálcio e magnésio, pois são elementos que contrariam a acidez.

A carência de magnésio manifesta-se também nas folhas mais velhas, apresentando estas riscas esbranquiçadas ou avermelhadas entre as nervuras.

Zinco (Zn)

O zinco é um micronutriente muito pouco móvel no solo. A sua assimilabilidade pelas plantas depende muito do pH do solo (mais adiante veremos com mais pormenor o significado de pH). Valores de pH elevados e teores muito altos de fósforo tendem a contribuir para a carência de zinco na planta, embora exista no solo em quantidades razoáveis.

Os sintomas de carência de zinco surgem nas folhas novas. Caracterizam-se por uma faixa de cor clara entre a nervura principal e o bordo da folha. A faixa, nalgumas variedades, tende a ficar avermelhada.

Reacção do solo - pH - acidez

e alcalinidade

Quando o cálcio, o magnésio e o potássio são arrastados pela água e lavados do solo, fica no seu lugar o hidrogénio (H), que tem características ácidas. Pelo contrário, o cálcio, magnésio e potássio têm características básicas ou alcalinas. A forma mais simples de avaliar a acidez ou alcalinidade da terra é a medição do seu pH, cuja escala traduz a concentração de H na solução do solo. Quanto mais pequeno o valor de pH maior é a concentração de H e menor a de substancias básicas.

A escala de pH varia de 0 a 14, tendo o valor 7 a característica de ser o ponto neutro, isto é, em que a concentração de H é igual ao de bases. Abaixo de 7 as soluções são ácidas, acima de 7 são alcalinas. No quadro seguinte indica-se classificação para os valores de pH mais frequentes do solo e a sombreado os valores mais frequentes no Arquipélago.

A reacção do solo ou pH tem grande influência no comportamento dos nutrientes do solo e no crescimento das plantas. Os nutrientes encontram-se em formas mais facilmente assimiláveis pelas plantas quando o pH se encontra na faixa de 6 a 7,5. É por isso que é necessário corrigir a acidez dos solos ácidos, podendo-se utilizar um correctivo alcalinizante como o calcário (carbonato de cálcio) ou a cal (óxido de cálcio). Deve-se ter em atenção que o poder correctivo da cal é duas vezes superior ao do calcário.

 

Compreender a análise da terra

A análise de terra para recomendações de fertilização mede os teores de matéria orgânica e de nutrientes assimiláveis do solo, bem como o pH. Já vimos que a classificação do pH é feita através de uma escala própria. Os nutrientes minerais são classificados em cinco classes no tocante à quantidade na forma assimilável que existe no solo:

Muito baixa: - Significa que a terra é muito pobre no elemento e que para que as plantas produzam adequadamente é necessário aplicar quantidades elevadas do nutriente;

Baixa: - A terra é ainda pobre, necessitando de quantidades elevadas do nutriente, embora menores que no caso anterior;

Média: - A terra tem uma quantidade do nutriente razoável, necessita de quantidades médias do nutriente;

Alta: - A terra tem quantidades do nutriente satisfatórias mas para atingir altas produções precisa da aplicação de uma quantidade moderada do nutriente.

Muito alta: - O solo é muito rico no nutriente, só em alguns anos e para altas produções se justifica a sua aplicação, sempre em quantidades moderadas.

A unidade de medida mais frequentemente usada nos laboratórios de terras é a que apresenta os parâmetros em ppm (que se lê partes por milhão) e tem o mesmo significado que mg/kg. Por exemplo, 30 ppm ou 30 mg/kg de P2O5, têm o mesmo significado, isto é, num kg de terra encontram-se 30mg de fósforo assimilável, expresso em P2O5.

Uma parcela cuja análise revele que, por exemplo, o fósforo está na classe muito baixa, poderá necessitar de uma adubação com cerca de 150kg de P2O5, enquanto uma parcela em que o teor se encontra na classe alta necessita apenas de 50 kg de P2O5, admitindo que as duas parcelas podem atingir a mesma produção. Vejamos o exemplo do seguinte boletim de análise, duma parcela destinada à cultura do milho:

Fósforo                30 ppm Muito baixo

Potássio              190 ppm              Muito alto

Magnésio           125 ppm              Muito alto

Zinco     0,8 ppm               Baixo

Matéria orgânica             4,1 %     Alto

Textura                Grosseira

pH          5,3

Necessidade de cal        8 t/ha de carbonato

                de cálcio

 

Recomendação:

8 t/ha de carbonato de cálcio

200 kg/ha de azoto (N)

130 kg/ha de fósforo (P2O5)

3 kg/ha de zinco (correspondentes a 4 kg de óxido de zinco)

 

Como proceder à fertilização?

A calagem deve ser a primeira operação a ser realizada. Como a quantidade a aplicar é muito grande, pode ser aplicada em 2 anos, aplicando metade logo no primeiro ano, ou seja, 4 toneladas. Se utilizar cal será conveniente utilizar menos, cerca de 1,5 t/ha. Só depois da incorporação do calcário ou cal, com uma lavoura, se deverá proceder à distribuição do fósforo e azoto e outros nutrientes que sejam recomendados.

No caso do azoto, podemos aplicar 1/3, ou seja, 60 a 70 kg/ha, em fundo e o restante em cobertura, quando o milho atingir a altura do joelho (milho joelheiro). O fósforo e zinco devem ser aplicados em fundo. Se tivermos adubos simples, por exemplo nitrato de amónio a 27% e superfosfato de cálcio a 18%, será fácil de determinar a quantidade a aplicar.

Azoto:

- 100 kg de adubo (2 sacas) a 27% de N correspondem a 27 kg de N

- 225 kg de adubo (4 sacas e meia) correspondem a 61 kg de N

Ou seja, com 225 kg/ha, 4sacas e meia, aplicamos a quantidade de azoto pretendida em fundo. Convém relembrar que não é conveniente aplicar muito azoto nítrico em fundo e que o nitrato de amónio contém metade do seu azoto naquela forma.

Fósforo:

- 100 kg de adubo (2 sacas) a 18% de P2O5 correspondem 18 kg de P2O5

- 725 kg de adubo (14 sacas e meia) correspondem 130 kg de P2O5.

Com 725 kg/ha de superfosfato a 18% obtínhamos a fertilização em fósforo pretendida.

Faltaria a aplicação de zinco. Não havendo de óxido de zinco ou sulfato de zinco no mercado, a maneira mais simples de resolver o problema era recorrer a um adubo com zinco ou, em alternativa, utilizar um chorume de porco, produto que é rico neste nutriente. A aplicação de zinco, num caso como o do exemplo, seria imperativo caso fosse feita a calagem. Não havendo zinco no mercado seria uma opção válida só proceder à calagem no ano seguinte, uma vez que a calagem poderia insolubilizar o zinco disponível, agravando em muito a sua carência, com consequências graves na produção.

E dispondo também dos adubos

20-20-0 e 25-15-0 ?

Nestes casos, o mais simples é verificar qual o equilíbrio da adubação de fundo. Admitindo que se pretendia, tal como no exemplo anterior, aplicar 1/3 do azoto em fundo, ficaria:

É fácil verificar que a adubação com aqueles adubos compostos fica muito abaixo do pretendido em fósforo no caso de se aplicar apenas cerca de 60 kg de azoto. Poderia ser vantajoso aplicar o fósforo em falta na forma de superfosfato de cálcio se o preço dos adubos assim o justificasse. O custo da adubação deve ser sempre um factor a ter em conta na escolha dos adubos.

E se aplicasse todo o azoto em fundo?

Nestes casos será conveniente utilizar adubos em que o azoto é convertido em nitrato de forma mais lenta, sendo conhecidos no mercado por adubos específicos ou com azoto estabilizado. A quantidade total de azoto deve ser reduzida em cerca de 20% nestes casos. As vantagens destes adubos consistem na menor aplicação de azoto e menores despesas de distribuição.

De qualquer modo, tendo em atenção o exemplo, pode verificar-se que a quantidade necessária de fósforo seria muito ultrapassada com qualquer dos adubos. Dependendo dos custos do adubo, a opção poderia ser:

No caso de se utilizar o adubo 20-20-0, seriam necessários 650 kg/ha, devendo aplicar-se em cobertura 100 a 200 kg/ha de nitrato de amónio 27% (de acordo com o desenvolvimento das plantas e da forma como decorrer a cultura, será mais fácil, mais tarde, determinar a quantidade a aplicar em cobertura). Neste caso não conviria aplicar o nitrato de amónio em fundo dada a quantidade elevada de azoto nítrico que este adubo contém.

Optando pelo adubo 25-15-0, verifica-se que a adubação seria deficiente em fósforo, faltando cerca de 25 unidades. A incorporação de 150 kg de superfosfato a 18 % seria a melhor opção.

Conselhos práticos:

- Sempre que a recomendação de fertilização permita um ajustamento com adubos compostos, estes devem ser preferidos. São mais práticos de aplicar, dispensam misturas que são sempre difíceis de distribuir de forma uniforme no terreno. É suficiente, na maioria dos casos, fazer os cálculos de aplicação até meio saco, não havendo a preocupação de colocar a mais ou a menos quatro ou cinco quilos de adubo por hectare.

- Não misturar adubos com calcário ou cal. Distribuir o calcário, proceder a uma lavoura ou gradagem e só depois proceder à distribuição do adubo a lanço.

- Aplicando parte da adubação de fundo a lanço e parte localizada (na linha), conduz, geralmente, a melhores resultados, uma vez que proporciona um arranque mais rápido às plantas.

- Nos casos em que haja possibilidade de localizar o adubo, isto é, ficar colocado perto da semente, não colocar mais de 40 kg/ha de azoto na linha. Por exemplo, no caso do adubo 20-20-0, não usar mais de 200 kg/ha na forma localizada.

António Videira da Costa, Engº.