Fábrica de Rações Santana
A Nutrição ao Serviço da Lavoura
Nos dias que correm, é amplamente reconhecido que a redução da fertilidade em explorações leiteiras é um dos fatores mais importantes que afetam a sua rentabilidade. A alimentação na fase inicial da lactação tem um importante papel na fertilidade, nomeadamente, o rácio energia: proteína (E:P). A produção de leite e o consumo de matéria seca (MS) em vacas leiteiras são estimulados em resposta a um aumento da ingestão de proteína bruta (PB) na dieta, mas, infelizmente, a diminuição da fertilidade está frequentemente associada a esta estratégia nutricional. Alimentos proteicos A proteína é encontrada na parte mole e verde das plantas, em particular, nas folhas. Quando uma planta cresce, desenvolve-se uma haste forte e torna-se menos rica em nutrientes. É por isso que uma planta mais velha contém menos proteína. O conteúdo proteico dos alimentos é expresso em termos de proteína bruta (PB), segundo o sistema americano de formulação de dietas National Research Council. Ureia: produto final do metabolismo proteico dos ruminantes A proteína da dieta é metabolizada em amoníaco (NH3) no rúmen, que é então convertido em proteína microbiana ou absorvido para a corrente sanguínea. Quando a energia da dieta não é suficiente ou quando a percentagem de proteína bruta na dieta é excessiva ou altamente degradável, nem todo o amoníaco produzido no rúmen é convertido em proteína microbiana. O amoníaco em excesso atravessa a parede ruminal e passa para a corrente sanguínea onde é transformado em ureia pelo fígado. O uso de quantidades elevadas de fertilizantes azotados conduz a mudanças nas características nutricionais das forragens, aumentando o seu conteúdo em proteína bruta, sendo posteriormente transformado em ureia. Ureia no leite Devido à sua difusão passiva, a concentração de ureia nos fluidos corporais é idêntica, daí que os níveis de ureia no sangue e no leite estão muito relacionados. No entanto, os valores de ureia no leite (MUN) podem variar com o tipo de alimentação, com o número de partos, com a produção de leite, com a fase de lactação, com a mudança de estação e com o balaço energético e estado de saúde da vaca. A proteína e a energia da dieta podem, de uma forma rápida e barata, ser monitorizada através do doseamento dos valores da ureia do leite, o que permite, ajustar o arraçoamento das vacas consoante o objetivo do produtor, diminuindo os custos alimentares. Além disso, este tipo de monitorização pode desempenhar um papel importante na fertilidade dos animais da exploração leiteira, isto porque o excesso de proteína bruta na dieta pode prejudicar o desempenho reprodutivo das vacas leiteiras. Os valores ideais de ureia no leite situam-se ente as 27mg/dL (270mg/kg) e as 30mg/dL (300 mg/kg); abaixo de 25,6 mg/dL (256 mg/kg), os animais estão a ingerir pouca quantidade de proteína bruta na dieta e acima de 34,2 mg/dL (342 mg/kg) estamos perante uma situação de excesso de proteína bruta ou de deficit de energia na dieta. Nos Açores, onde a pastagem é a maior fonte de alimento das explorações e, que se apresenta pobre em fibra e rica em trevo, na maior parte do ano, ou seja, com excesso de proteína bruta, estima-se que estes valores de ureia sejam ligeiramente superiores aos referidos na literatura para outros sistemas de alimentação e níveis de produção, nomeadamente no continente. Influência da ureia na fertilidade Podem ocorrer alterações reprodutivas devido ao excesso de ingestão de proteína, e à gravidade do balanço energético negativo durante o início da lactação, levando ao aumento da ureia circulante e do leite. Daí que o recurso à análise das concentrações de ureia no leite como um marcador de fertilidade em vacas leiteiras tem recebido recentemente, muita atenção. O estabelecimento da gestação corresponde a uma progressão ordenada de eventos: desenvolvimento folicular que resulta na ovulação, fertilização do oócito, transporte e desenvolvimento do embrião, reconhecimento materno e implantação. Assim, a ureia (acima dos valores ideais), ou algum outro tóxico que resulte do metabolismo das proteínas, podem comprometer uma ou mais destas etapas e, desta forma, condicionar a eficiência reprodutiva. Conclusão As concentrações de ureia no leite podem ser utilizadas como um indicador da relação da energia/proteína no arraçoamento, principalmente para vacas que se encontram dependentes da pastagem, como fonte principal de alimento. Estes valores de ureia no leite permitem-nos, então, acertar a quantidade de energia e proteína, através da correção do arraçoamento, nomeadamente no que toca ao tipo e quantidade de concentrado fornecido aos animais. No entanto, as concentrações de ureia variam de exploração para exploração e de animal para animal, daí que, para se interpretar corretamente esses valores, é importante ter em conta outros factores para além do arraçoamento, nomeadamente, a produção de leite, o maneio e a genética. Além de nos permitir acertar o arraçoamento, os valores de ureia no leite também nos podem ajudar a identificar distúrbios de saúde ou razões para falhas reprodutivas. Assim, vacas de alta produção com valores baixos de ureia, provavelmente, utilizam a proteína da dieta de uma forma mais eficiente, o que sugere ser possível alcançar altas produções de leite com valores baixos de ureia. Para isto, apenas é necessário uma boa monitorização periódica desses valores nas explorações e, fazer as mudanças adequadas no arraçoamento. Este acompanhamento das explorações a nível nutricional irá permitir, não só uma oportunidade para reduzir custos alimentares como também abrir uma porta para o melhoramento da eficiência reprodutiva da exploração. PATRÍCIA MIRANDA Aluna FMV, Estagiaria AASM Bibliografia Godden, S. (2001a). Relationships between milk urea concentrations and nutritional management, production, and economic variables in Ontario Dairy. Jornal of Dairy Science, pp. 84: 1128-1139. Godden, S. (2001b). Factors associated with milk urea concentrations in Ontario dairy cows. Jornal of Dairy Science, pp. 84: 107-114. Guo, K. (2004). Effects of milk urea nitrogen and other factores on probability of conceptio of dairy cows. Journal of Dairy Science, pp. 87: 1878-1885. Lehninger. (2004). Principles of Biochemistry. W. H. Freeman & Company. McDonald, & Edwards. (2011). 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